Na inscrição do vaso do arúspice
as palavras do inconformado intérprete:
Devemos fazer um processo contra Deus
que não soube fazer previsões
e condenou impunemente os homens
pêlos crimes que iriam ou não iriam cometer,
embora devesse saber
que tipo de culpa teria cada um,
tendo criado todos os seres e todas as culpas
e ignorado os inocentes, mas mesmo assim
condenou-nos todos à eternidade da morte
e às outras eternidades do medo e da esperança
dos inexistentes céu e inferno.
Deverá responder perante cada criatura
pêlos tormentos e incertezas
dessa invenção de Adão e Eva,
das ameaças do Pecado Original
e dos sacerdotes que as perpetuaram.
O preço
Paguei todos os preços
que pediram: para começar
nasci.
Depois fui tropeçando
sabendo e não sabendo,
vendo e não vendo,
mas o tempo todo
pagando todos os preços sobrepostos.
— E a solidão?
Acho
que paguei muito mais do que cobraram.
que pediram: para começar
nasci.
Depois fui tropeçando
sabendo e não sabendo,
vendo e não vendo,
mas o tempo todo
pagando todos os preços sobrepostos.
— E a solidão?
Acho
que paguei muito mais do que cobraram.
Dúvida
O que fazer da alma quando o corpo ruge
a sua fome
— e o que fazer do corpo quando
a alma hesita?
a sua fome
— e o que fazer do corpo quando
a alma hesita?
Autobiografia
Há quarenta e tantos anos
meu pai pensou que eu ia nascer:
mas quem nasceu foi meu irmão mais velho
que hoje sofre de velhice e da doença de não saber de nada.
A esperança é branca
a morte é negra
o amor é pobre
a vida é fugaz
eu sou arco-íris)
que nasceu dezesseis anos depois
calvo, sozinho, branco e preto,
às vezes no mundo vinte e tantos anos depois.
meu pai pensou que eu ia nascer:
mas quem nasceu foi meu irmão mais velho
que hoje sofre de velhice e da doença de não saber de nada.
A esperança é branca
a morte é negra
o amor é pobre
a vida é fugaz
eu sou arco-íris)
que nasceu dezesseis anos depois
calvo, sozinho, branco e preto,
às vezes no mundo vinte e tantos anos depois.
Precisados
precisamos desses tóxicos
desse som dessa fumaça
desse medo intemporal
integrado no artifício
de nosso contentamento:
precisamos desse tempo
diluído em nossa alma:
precisamos esquecer.
precisamos nos matar
nessa mesma ecologia
de uma alma poluída
e da carne imergida
em abstrusa euforia.
precisamos desse sonho
circulando em nossos nervos
precisamos desse sangue
encobrindo nossos olhos
precisamos da sentença
e de como evitá-la:
precisamos desses fatos
para neles sancionar
todo o tempo improrrogável.
desse som dessa fumaça
desse medo intemporal
integrado no artifício
de nosso contentamento:
precisamos desse tempo
diluído em nossa alma:
precisamos esquecer.
precisamos nos matar
nessa mesma ecologia
de uma alma poluída
e da carne imergida
em abstrusa euforia.
precisamos desse sonho
circulando em nossos nervos
precisamos desse sangue
encobrindo nossos olhos
precisamos da sentença
e de como evitá-la:
precisamos desses fatos
para neles sancionar
todo o tempo improrrogável.
Landscape
de águas em pedras ressurgem carneiros
e folhas podadas no pão da infância
o pai escondido, o menino chorando
as vagas presenças da morte por vir.
de chuva no céu, calçadas ardentes
fluidos perdidos, se eleva a lembrança
de longe das casas, dos ventos molhados
na face e nos cachos de longos cabelos.
martela-se um canto e o som é paisagem
um gosto na boca nascendo a memória:
sabia o futuro, sabia a lembrança
e sabia o passado, sabia a morte.
chorava o menino perdido na cama
choravam carneiros e folhas nas águas
o frade de pedra podava a parreira
e o fruto proibido de cores carnava.
e vinham manhãs e vinham crepúsculos
e vinha o rio por cima da ponte
( e vinha o menino olhando no escuro
o homem seguindo seu rumo de nada).
de cima da ponte crescia a cidade
no solo estrangeiro o homem-menino
olhava-se o rio de onde outras velas
inflaram-se em busca de amplos espaços.
e desse país repleto de aldeias
trouxeram os nomes, veio o menino
vieram as águas e vieram as folhas
ficaram memória e o espanto da morte.
e folhas podadas no pão da infância
o pai escondido, o menino chorando
as vagas presenças da morte por vir.
de chuva no céu, calçadas ardentes
fluidos perdidos, se eleva a lembrança
de longe das casas, dos ventos molhados
na face e nos cachos de longos cabelos.
martela-se um canto e o som é paisagem
um gosto na boca nascendo a memória:
sabia o futuro, sabia a lembrança
e sabia o passado, sabia a morte.
chorava o menino perdido na cama
choravam carneiros e folhas nas águas
o frade de pedra podava a parreira
e o fruto proibido de cores carnava.
e vinham manhãs e vinham crepúsculos
e vinha o rio por cima da ponte
( e vinha o menino olhando no escuro
o homem seguindo seu rumo de nada).
de cima da ponte crescia a cidade
no solo estrangeiro o homem-menino
olhava-se o rio de onde outras velas
inflaram-se em busca de amplos espaços.
e desse país repleto de aldeias
trouxeram os nomes, veio o menino
vieram as águas e vieram as folhas
ficaram memória e o espanto da morte.
Didática Sobre a Morte
Tudo o que resta, o tempo para a morte
que por isso é o espaço ancestral.
Todo o tempo que resta — e é para a morte
esse que nos falta em esperança.
E assim nos restando a morte espera
o que somos e em nós se desperdiça.
Guardamos os guardados — e a vida.
(E a morte nos toma o que guardamos.)
Privamos da alegria, em sacrifício,
o que vamos dedicar depois à morte
em nosso campo de avaros a esse tempo
subtraído depois ao desperdício
que poderia ser vida se estivéssemos
na vida mais lentos para a morte.
que por isso é o espaço ancestral.
Todo o tempo que resta — e é para a morte
esse que nos falta em esperança.
E assim nos restando a morte espera
o que somos e em nós se desperdiça.
Guardamos os guardados — e a vida.
(E a morte nos toma o que guardamos.)
Privamos da alegria, em sacrifício,
o que vamos dedicar depois à morte
em nosso campo de avaros a esse tempo
subtraído depois ao desperdício
que poderia ser vida se estivéssemos
na vida mais lentos para a morte.
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